No campo da saúde coletiva, muitos autores se apoiam na filosofia de Espinosa sobre a “potência de agir”, um conceito instrínseco à saúde do corpo e da mente. A expressão da plena vitalidade é a ideia central que vincula este conceito ao de “potência de vida”, uma perspectiva que entrelaçada à ética da alegria, ilumina a importância dos bons encontros.
Os bons encontros são como catalisadores que impulsionam o potencial das pessoas, conectando-as a novas dimensões nas relações interpessoais. Seguindo a ideia de Deleuze, esses encontros não são apenas interações enriquecedoras que fortalecem os vínculos, mas também representam linhas que quebram as estruturas convencionais, abrindo espaço para a multiplicidade como fonte de transformação e criação.
Enquanto, para Deleuze, bons encontros são eventos que abrem possibilidades não previstas e espaço para a diversidade, inovação e processos criativos, Winnicott, pediatra e psicanalista do século XX, propõe a criação como fonte de saúde pessoal. Para ele, a saúde é vivenciada quando nos percebemos criando o mundo a partir de nossas criações pessoais partilhadas e a atividade criativa e a sensação de expansão são elementos essenciais para a realização pessoal e a vivência plena.
A saúde, sob essa perspectiva, transcende medições, médias ou normalizações, sendo sempre relativa e singular. Recuperar a saúde implica uma vivência pessoal, intimamente ligada à recuperação da capacidade vital ativa e criativa em relação à própria vida. Esta compreensão, ainda que poética, se articula diretamente à definição técnica da Organização Mundial da Saúde sobre saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas como a ausência de doença ou enfermidade.
Arte Despertar: promovendo saúde e bons encontros
A busca por catalisar bons encontros e promover a saúde está, assim, no centro da atuação da Arte Despertar. O envolvimento estético, a ativação da imaginação, a estimulação cognitiva e as emoções emergentes das interações são componentes do fazer da organização que desencadeiam respostas no atendido e no próprio atendimento em saúde. Sejam elas de caráter social, como o fortalecimento de vínculos; psicológico, como a melhoria da saúde mental; comportamental, como o desenvolvimento de habilidades; ou fisiológicas, como a redução de hormônios do estresse.
Ao incorporar expressões artísticas, a instituição proporciona experiências criativas que estimulam a potência de vida, contribuindo para a construção de narrativas únicas de saúde. A abordagem respeitosa à individualidade reforça a importância de cada interação como um encontro significativo, alinhado aos princípios de autonomia, vitalização e criação.
Saiba +
Plano anual: promovendo cultura nos hospitais – o projeto Plano Anual: Promovendo Cultura nos Hospitais foi a iniciativa mais longa da Arte Despertar, realizada entre 2014 e 2023. A partir de intervenções, arte-educadores buscavam aliviar o desgaste e muitas vezes a dor presentes no ambiente hospitalar, oferecendo momentos de escape e expressão para pacientes, familiares e profissionais de saúde.
O atendimento da Arte Despertar em hospitais: documento orientador: Utilizado como referência ao longo dos anos para orientar a atuação e promover a reflexão entre a equipe de arte-educadores, a Arte Despertar disponibiliza essa sistematização como contribuição para o campo ainda pouco explorado no Brasil da interseção entre arte e saúde.
Depoimento: O atendimento com arte no contexto hospitalar: “Assim como uma medicação atravessa a corrente sanguínea e causa transformações no corpo, uma palavra e um som também podem fazer isso”. Geraldo Orlando e Kelly Jardim, que trabalharam por mais de uma década como arte-educadores da Arte Despertar em hospitais, contam um pouco do muito que observaram e aprenderam nesses anos.